A Universo Paralello, rave de Israel interrompida por ataques terroristas no último sábado (7), faz parte do popular calendário de festivais de música eletrônica do país. O evento foi um dos locais atingidos pelo ataque coordenado do grupo islâmico Hamas ao país, que vitimou mais de 260 pessoas só no espaço incluindo os brasileiros Bruna Valeanu, de 24 anos, e Ranani Glazer, de 23.
Após o ataque, a organização da festa foi criticada nas redes sociais por realizar a rave em uma área próxima da Faixa de Gaza. Mas a escolha do espaço, a menos de 20 quilômetros da região de conflito do país com a Palestina, reflete a efervescência cultural que se criou por ali.
Israel, afinal, permaneceu uma democracia ao longo das décadas, mesmo entre crises políticas e militaristas com o povo palestino. A maior parte da população religiosa do país tampouco cerceou a liberdade individual, e a vida noturna pode prosperar nos grandes centros urbanos.
O resultado é que o país hoje possui regiões que se tornaram pequenos oásis libertários em meio aos diferentes estados ditatoriais do Oriente Médio. A cidade de Tel Aviv, por exemplo, já foi premiada como o melhor lugar de turismo gay do planeta, graças ao amplo espaço à comunidade LGBTQIA+.
A farta vida noturna da metrópole, centro financeiro de Israel, é quase o oposto do que acontece em países próximos, como a Arábia Saudita, o Qatar e os Emirados Árabes, que aplicam leis duras contra homossexuais incluindo a pena de morte.
A noite se estende às raves, que acontecem ao longo dos desertos e da costa mediterrânea. O país vive uma relação intensa com a música eletrônica desde o fim dos anos 1980 e o começo dos 1990, quando a juventude israelense entrou em contato com a música pela Índia.
Os indianos afrouxaram as regras para a admissão de cidadãos de Israel nessa época, o que intensificou o turismo, em especial dos jovens. Recém-saídos do serviço militar obrigatório e querendo escapar da realidade conservadora do país, os israelenses passaram a viajar com frequência a cidades como Goa.
O maior contato com a cultura local, que vivia um novo auge da psicodelia, acabou por fomentar a descoberta do psytrance, um subgênero da eletrônica trance influenciado pela lisergia importado de países europeus. Com isso, as primeiras raves foram organizadas em Israel.
As festas não agradaram os mais conservadores, mesmo já acontecendo fora dos grandes centros. Grupos tradicionalistas do país criticavam os eventos pelo consumo de drogas e por suas expressões artísticas, que bebiam da espiritualidade indiana.
Apesar da resistência, o movimento desencadeou uma porção de festas que acontece até hoje na região. Entre os meses de setembro e outubro, áreas remotas e desérticas de Israel se transformam em palco de eventos como o Zorba Festival, a Unity Rising Spirit e o Tamar Festival.
Os festivais também se internacionalizaram, e Israel hoje recebe pessoas de todo mundo só pelas raves. As festas têm cerca de de 5.000 a 10.000 visitantes e continuaram a acontecer mesmo durante a pandemia de Covid-19, período em que foram chamadas de "festas da natureza".
A popularidade permitiu que eventos internacionais de eletrônica se interessassem pelo país, o que por sua vez levou a organização da edição local do Universo Paralello. A festa, que acontece a cada dois anos, foi criada em Goiás em 2000, também tendo como base o psytrance, e acontece hoje na Bahia.
A organização anunciou o evento em Israel como parte de uma turnê mundial, depois de passar por países como Argentina, Espanha, México e Tailândia.